Ressuscitar o Aqui Agora no mês do aniversário do SBT tinha tudo para ser um golaço. O horário é estratégico, o nome ainda tem força na memória do público e a concorrência com Cidade Alerta (Record) e Brasil Urgente (Band) pede um produto popular, direto e com pegada. Mas, no ar desde segunda, 4 de agosto, a nova versão ainda não achou a própria voz.
A emissora recolocou o programa no ar como “temporada especial” — um teste, na prática — mantendo a faixa das 18h30 às 19h45 para a Grande São Paulo e praças sem programação local. Dani Brandi e Marco Pagetti assumiram a bancada, substituindo o Tá na Hora, que saiu na sexta, 1º de agosto. O plano do SBT para agosto, quando completa 44 anos em 19/8, inclui também a volta de marcas conhecidas em formatos especiais: um quadro do Topa Tudo por Dinheiro no Programa Silvio Santos com Patrícia Abravanel, além de SBT Repórter e Jornal do SBT.
O movimento conversa com uma tendência clara na TV aberta: usar a nostalgia como atalho para atenção. Funciona quando a memória vem com atualização real — linguagem, ritmo, visual e, principalmente, jornalismo. E é aqui que o retorno derrapa.
A abertura sempre foi cartão de visitas do Aqui Agora. Desta vez, ela perdeu impacto por três escolhas que cortam a energia logo de cara: a ausência da trilha sonora marcante, chamadas sem punch e um locutor tentando imitar Luiz Lopes Corrêa (1929–1999). Imitar não homenageia; só envelhece o que deveria soar atual.
O original dos anos 90 se impôs pela mistura de rua, urgência e textos secos. Não era só barulho: havia ritmo, personagens, imagens fortes e um senso de “estamos onde a notícia está”. Sem uma assinatura sonora reconhecível, sem frases de efeito bem lapidadas e com uma narração que soa cosplay, a abertura de 2025 entra fria e deixa o bloco inicial sem a tensão que esse tipo de noticiário pede.
Telejornal popular vive de clareza e entrega. As chamadas precisam ser curtas e com verbo de ação. O off do narrador tem que guiar o olhar, não disputar com as imagens. Quando o texto é genérico, o público desliga porque a concorrência entrega urgência e exclusividade o tempo todo. No mesmo horário, Record e Band trabalham com escalas robustas de reportagem de rua e operações ao vivo. Para competir, o SBT precisa dar a sensação de presença — e isso começa na forma como o programa se anuncia a cada bloco.
Outro ponto: identidade visual. Reboot pede atualização gráfica de primeira linha, com pacotes de vinhetas e lower thirds que organizem a enxurrada de informação ao vivo. Quando o visual é burocrático, a percepção é de improviso. E improviso constante, em TV aberta e no horário nobre da informação, custa caro em atenção.
Também pesa a construção da dupla de apresentadores. Dani Brandi e Marco Pagetti têm ritmo, mas a química ainda não transparece nas passagens e na condução de entrevistas. Bench de telejornal popular funciona melhor quando há papéis claros: quem puxa a manchete, quem tensiona, quem segura a emoção. Sem essa divisão tácita, o programa perde cadência.
O caminho não é voltar ao passado peça por peça, e sim recuperar o DNA com soluções de 2025. Começa pela abertura: vale resgatar um motivo musical que remeta ao clássico ou criar uma assinatura moderna, de três notas, fácil de reconhecer. Em paralelo, reescrever chamadas com verbo forte, números e serviço. “Quem? O quê? Onde? Quando? E o que muda pra mim?” precisa caber em duas frases.
O locutor deve abandonar a imitação e assumir timbre e ritmo próprios. Em vez de tentar recriar a entonação de Corrêa, melhor apostar em narração conversada, com pausas no lugar certo, que deixe a imagem trabalhar. O público percebe autenticidade.
No conteúdo, diferenciação é palavra-chave. A faixa já está bem servida de helicóptero, perseguição e plantão policial. O SBT pode ocupar um flanco menos explorado: serviço ao cidadão. Mapas de transporte e trânsito em tempo real, lista de direitos em casos de golpe, atendimento público que não funciona, preço de alimentos por região, ranking de remédios em falta, análises curtas que expliquem por que aquela operação policial está acontecendo ali. É o tipo de pauta que prende e fideliza.
Outro ajuste é a governança editorial. Estabelecer um manual claro para coberturas de violência evita exageros e dá segurança jurídica e ética. Close em rosto de vítima? Não. Apologia ao vigilantismo? Não. Identificação de menor? Não. Quando o público entende que há regra, cresce a confiança, e anunciantes também percebem isso.
Digital não é adereço. Reunião de pauta precisa nascer com plano de segunda tela: quais trechos virarão cortes verticais, quais dados entram em carrossel, qual enquete colhe insumo do público para o bloco seguinte. Integração de redes ao vivo funciona quando editores definem o que vale entrar, e não quando o chat pauta o jornal sem filtro.
Produção também ganha com quadros fixos de curta duração: “Golpe do dia explicado em 60 segundos”, “Mapa da cidade: onde está faltando água”, “Fato ou boato”. Eles criam memória de audiência e dão ritmo ao miolo do programa, que costuma ser onde a curva de atenção cai.
Na disputa direta com Cidade Alerta e Brasil Urgente, o trunfo pode estar na consistência. Prometer menos e entregar mais, todos os dias, na mesma hora, com a mesma assinatura visual e um texto que não trate o público como plateia de susto. Quando a casa arruma abertura, locução, texto e serviço, o resto começa a alinhar.
O plano maior do SBT para o mês de aniversário, com Topa Tudo por Dinheiro como quadro e a volta de SBT Repórter e Jornal do SBT, mostra que a emissora quer testar marcas e ver o que gruda. Nostalgia, sozinha, não segura 75 minutos diários. Marca ajuda a abrir a porta; quem mantém o público sentado é reportagem, apresentação com identidade e um projeto editorial que saiba por que existe.
No histórico recente da TV aberta, reboots deram certo quando trouxeram algo novo além do nome. O próprio SBT já reativou formatos conhecidos com ajustes de linguagem e patrocínio integrado. A lição é a mesma aqui: resgatar memória com atualização real, e não com imitação. O relógio das 18h30 anda rápido. Quem não entrega nos primeiros dois minutos perde a noite.
Sou especialista em notícias e adoro escrever sobre os acontecimentos diários do Brasil. Meu trabalho é trazer informações relevantes para o público, sempre com uma abordagem objetiva e clara. Trabalho como jornalista há mais de 15 anos e continuo apaixonado pelo que faço. Acredito que a boa informação é essencial para uma sociedade bem informada.
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